quinta-feira, junho 3

e de repente, ainda assim tão logo, percebeu-se que não era ele.
Vi que o amor vinha de mim mesma, irradiando-se em todas as direções, forte lindo e novo a cada respiração ofegante que resulta de seu contato direto com algum corpo ou energia que o faça esquentar.
E num instante apaga-se a velha ideia, compreende-se e assim mata-se a velha crença. A de que era dele que, como de um ser naturalmente de existência excepcional, fluia naturalmente algo que eu como um transformador recebia e o que era a única matéria-prima possível do único produto relevante que meu tambor peitoral aprendeu a produzir, o amor.
Ele simplesmente precisaria existir, e de lá eu sugaria mesmo à distância o néctar da mais fina flor, improvável e impossível e ainda assim mais presente do que qualquer outra substância na lista dos ingredientes que a receita da felicidade exige que sejam comprados, ou melhor, conquistados.
E ele existia independentemente dessa receita, ele provavelmente, ele quase que certamente nem duvidava da existência da receita, e apenas desfilava sua magnificência por aí, espalhando a matéria-´rima gratuita pra qualquer candidata ao vício do amor que ele causava. Será mesmo?
Será que não era ele, esse sim, o grande alvo? que sendo carregado pelo vento de abelha em abelha, de solo em solo, produzindo depois de árduos dia de sol que queima como o arrepio e de chuva, e de chuva, salgadas lágrimas que deixou escorrer por suas flores, descuidado desculpando-se com a intenção de que se fortalecesse; as mais belas componentes de um jardim maravilhoso de mulheres novas e vivas, que seguiram seus rumos, que trilharam seus caminhos, que desfincaram as raízes de sua terra e buscaram por si próprias solos mais férteis onde pudessem ser singulares, especiais, interessantes? E onde fica essa velha semente, já tão gasta pela mania de ser pólen e se deixar carregar? Onde se esconde sua magnificência agora que já nenhum girassol o persegue?

Não existe.
Nunca existiu.
E hoje a rosa, grande e bela como ele a fez, como ele não a quis para si, mas causou que se tornasse para o mundo, o vê pequeno.
Vê a semente não como o motivo de sua existência, mas como o seu passado, ressequida, morta, desvirtuada depois de dar flores e flores cujo nome nem mesmo se recorda.
Ela, a rosa, se lembra de quantos de seus espinhos arrancou, de como se poliu para não ferir o magnífico e grandioso pólen que tanto venerava, e como agora daria tudo para ter de volta sua selvageria. Mas ela também já não é mais o mesmo botão que antes não sabia o que querer.

Se a rosa foi então capaz de enxergar de onde não vinha tudo aquilo de físico e imaterial que exalava, certamente ele se dava dicas inconscientes de de onde tudo VINHA;
e era dela.
era dos vasos de seiva que as lágrimas de orvalho molharam, encheram, fizeram secar, e dos lugares onde a ameaça de ser cortada e morte tornou seus amortalhados nervos praticamente humanos, que se expandia tudo aquilo que num poema qualquer decidira-se chamar amor.
O amor era dela, e no entanto só poderia existir e ser computado e materializado uma vez que não mais a pertencesse e ela o tivesse entregue a outrém, que por sua vez o receberia em tantas formas e tamanhos quanto lhe fosse possível compreender.
Porque o seu duro despontar fez da rosa flor mais forte do que se supõe,
e se ela for capaz de garantir a si mesma,então o amor que ELA tem para o mundo e também para o pólen, por mais que agora de uma outra dimensão e momento, não mais deslumbravél, mas aceitável, se espalhe por aí, e caia sobre nós

"Derrame o dom sobre nós
abençoe a nossa voz;
céu mudou, tá chovendo amor
Gotas de amor.
Deixa que o amor caia sobre nós
Deixa que o amor caia sobre nós !"


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