quarta-feira, julho 28

artesanato.

quase todas as vezes,
a gente simplesmente acaba sendo o que não queria
e eu espero que tudo o que falta
seja um pouco de movimento,
pra tirar de toda essa louca energia
a capacidade e a chance de criar um pouco de alegria.

de novo, de novo, de novo

e mais uma vez parece realmente e com força que a vida se repete na estação.
em cada estação, em tanta estação, nas muitas e talvez nas todas estações que dentro de mim se transformam violentas e súbitas, entrelaçadas na confusão que faz fundirem-se suas identidades, e as vezes morrem antes mesmo de deixar um suspiro concreto no mundo, uma prova de que um dia existiram.

de toda aquela vida e brutalidade que borbulha e aflora lá dentro no quente do peito, raramente ou quase nunca sobra alguma faísca pra contar a história em um sorriso ou lágrima ou coisa parecida.
é essa terrível fortaleza de mansidão, que combate com toda a sua calma e harmonia cada rebelde emoção que queira marcar com o tempo e as frustrações do amor e da vida a sua face de princesa.
são caladas, o volume de suas vozes implacavelmente diminuído, até que por fim acabem morrendo, longe de vislumbrar a luz do mundo de verdade, afogadas na alma que habita o corpo solitário, reféns da vergonha de ser.
será que algum dia elas conseguirão transbordar?

por enquanto continuam insistindo, modestamente revoltadas porque sabem ser escravas de onde moram, e não sabem ainda se nasceram do corpo ou da cabeça ou do coração. não têm a quem reclamar e ainda não conhecem o mundo para poderem reivindicar algum lugar nele.
mas onda após onda, continuam insistindo.. continuam vindo.. duvidam da própria força na maioria das vezes.
e acontecem sempre. e de novo, e mesmo onde se acreditou que o veneno matara todas as ervas daninhas, o sentimento não. em toda a sua fúria, não, ele ainda está lá. E como o vento se transforma, e quando então é brisa suave, até que seu familiar aroma em uma rua qualquer que não reconhecemos à luz do dia, ou em algum daqueles lugares de que sentimos saudades sem nunca ter adentrado, trará novamente à tona toda a bagunça.
a palpitação e a dúvida e as ideias e as ideias que se sobrepõem se sufocam e se julgam tudo dentro de nós tudo rápido e intenso e maravilhoso e principalmente e sempre assustador.

PARE
naturalmente não haveria rédeas pra segurar a força do mar de dentro em um dia de ressaca, em que sua racionalidade se revelasse grande e decidida e em explosão as ondas tomassem conta de todo o resto. e levassem embora toda a calma, tudo o que se construiu durante muito tempo.
então de novo os carrascos de tudo, os medos.
virão e afogarão as rebeldes ondas em si mesmas, sabem bem como por tudo em ordem.
mas que ordem é essa.
ordem de inverno, morta e sem sabor.
até quando tudo isso vai se repetir, essa ideia de que se deve ou pode trancar tudo? porque não deixar o barco à deriva, abrir o caminho para a explosão de tudo que acaba trancafiado no escuro e assim evitar que na receita de qualquer saudade exista alguma pitada de arrependimento ou de vontade que ficou?

todo esse frio trancado é a morte.
por favor, alguém que ouve, deixe que algum dia venha toda essa exuberante liberdade.

quinta-feira, julho 8

Ontem, na verdade

bateu essa vontade de ser menos.

menos eu, menos o que querem que eu seja, menos do que eu quero tanto ser.
menos viva, menos morrendo mais a cada respirar, menos intoxicada ao respirar sujeira material e espiritual do mundo que me cerca, menos nesse movimento incessante em lugar nenhum.
menos perdida.
menos diferente de tudo que eu entendo e sei definir, menos eu.
menos do que dizem e eu penso que me consideram ser, menos do que os outros que eu quero poder admirar e não consigo mais, não dá, menos eu.
menos do que eu serei amanhã e também menos do que eu fui ontem. menos do que eu estou me tornando e até mesmo menos do que eu sou nesse exato momento.
menos do que o instante de consciência em que se percebe ter algum valor, e então poderia ser livre novamente, como quando era menos, menos eu.

E com certeza tanta súbita e curta vontade faz parte de um desejo de voltar, e de não me sentir eu ou mesmo de não me sentir nada,
para que se possa querer de novo ser mais, e esparramar por aí as gigantescas asas,
e voltar a crescer.

quarta-feira, julho 7

Pra que nos deixemos ser mais

Já vou logo avisando de prólogo, que esse daqui talvez seja bem pouco, senão in,compreensível.

*

Uma coisa que muito me incomoda e pode-se até dizer que me irrita bastante, é o eu não saber o limite da superficialidade.
Quer dizer, e quando as luzes se acenderam antes do que se esperava, e se por dentro já fosse tudo claro e então ficasse mais claro ainda, nessa hora alguma força bruta e maior nos impede de chamar aquilo que queima de sentimento?
Sei sim, e penso ser necessário a muitos de nós, reconhecer a escuridão dos lugares aonde se vai e pelos quais vive-se a vida; mesmo assim não quero deixar de viver e acreditar naquilo que uma voz singela e tímida, que podemos fazer facilmente passar despercebida, nos murmura no semi-vazio calabouço das ideias....
...é de verdade...
e como poderia não ser de verdade tudo aquilo que faz, nem que seja por apenas um segundo, palpitar apressado um coração?
e no entanto ouço e percebo que não pode ser, que não deve ser, que não deixam nem deixamos ser...
É essa linha tortuosa que pensamos tênue, e se revela dura e afiada como o arame mais farpado ao menor toque, à menor pressão, ao mais efêmero lampejo de desejo de mudar de lado por um instante. Onde acabam-se as condições de continuar sendo assim, simplesmente tão.. superficial.
e mentiroso.

Sim,sim.
Mente-se a si mesmo nesses becos escuros, nesses cômodos barulhentos em que os murmúrios dos anjos bons e de nosso próprio lado puro vêem-se desesperadamente inaudíveis. E exasperam-se na tentativa de se fazerem ouvidos, na tentativa de que um tropeço pisada no pé bronca ou empurrão nos façam ver que, lá, nada enxergamos de verdade.
Mas não queremos ouvir os sermões chatos que eles nos passam. Não, a música vale mais a pena no momento. O momento, o momento.. quanto deixamos para trás pelo mero e (in/f)útil prazer do momento.. me intriga incomoda e irrita não ter a mínima noção de se algum tanto desse quanto é recuperável, de se podemos ou não ter de volta aquela pureza e aquelas vozes; e se sentimento algum dia viverá em quem não soube ouvi-lo ou cedeu às pressões do mundo de não aceitá-lo, ou simplesmente não o fez porque realmente a distância é mais confortável.

Alguma parte do que tinha aqui dentro pra crescer e sair e arranhar o mundo já se foi.
E a forma que tudo isso tomou do lado de fora não era a que eu queria, por mais que assim se pensasse, nas horas de rebentação. Por mais que se conformasse em se ser o que é, em estar aonde se está, em conviver com quem conhecemos e aceitá-los, assim mesmo..
Não se trata de compreender o outro nem de acompanhar quem precisa de nós, algo que faz parte da caminhada de quem não quer caminhar sozinho e eu tomarei enquanto puder como meu compromisso e com prazer;
mas de quanto deixamos de lado de nossas próprias crenças e motivações e talvez até princípios, nesse caminho, é o que me incomoda e me irrita tanto.
Porque realmente não vem de mim e eu sei que não é pra mim toda essa bagunça. Quer dizer, tem que haver outras formas de extravasar a energia da alma pro mundo de algum jeito que ela só seja BOA. e linda;
E que não incomodem e que não nos obriguem a enxugar as lágrimas quando olharmos para trás.
E que não nos obriguem a andar com pressa, a falar rápido, a esquecer, a se conformar com o mundo que sufoca nosso peito apressado e nos manda pensar que é tudo assim mesmo.
E que nos permitam não ter as experiência e os dissabores da idade do nosso corpo mas viver aquilo que sentimos com o tamanho que tiver do lado de dentro.
E que nos deixem estar onde isso tudo possa emanar e se propagar tanto quanto queremos e sabemos que sabemos fazer e talvez até bem.
E que nos mostrem onde não precisamos de capas de normalidade nem de convenções sociais que nos cortem os pedaços e nos deixem com os restos de quem somos, aos poucos, migalhas de nós, pra poder sorrir e permanecer.
E que nos desamarrem enfim de todas essas apreensões intrigantes e irritantes e todos esses medos inúteis que sentimos de nos deixar voar. Para que enfim partamos rumo a onde o pulsar do amor e do sangue nos impulsionarem e aos lugares onde sempre quisemos ser apenas o que temos por dentro, sem casca, sem cobertas, sem receios, só nós mesmos de cara pro mundo e nus de aperfeiçoamento. Apenas nossa própria essência exalando o que nenhum perfume pode imitar e não precisar de roupas de nenhuma natureza que nos protejam do julgo dos olhares assassinos porque lá eles não cabem. Só cabemos nós mesmos, e todo o amor que as noites escuras absorveram de nós, que vai voltar, e vai sair e ir, dessa vez apropriadamente destinado aos nomes que escrevermos no verso do envelope;
que pombas brancas solenemente carregarão, compreensivas e amáveis, aos quatro cantos do mundo.

terça-feira, julho 6

Há tantas violetas velhas, sem um colibri

É a falta.

É a falta em dois sentidos,

tanto como algo que vem de dentro e nos corrói, e a faz querer correr atrás do que deixou para trás e o trazer de volta, como se o antes fosse o presente e o futuro, mesmo depois de seu vaso ter sido despedaçado tantas e tantas vezes... (aka saudades)
como quando nos falta a coragem pra atirar aos quatro ventos o grito de partida dessa corrida desvairada e animalesca que nos leva até as coisas que mais queremos, e portanto em relação às quais nos vemos e consideramos mais incapazes de qualquer atitude grande que resolva tudo do jeito que nos permitimos sonhar visualizar e desejar com esperança durante as noites solitárias em que deixamos brilhar a luz do amor de nossa imaginação sobre nós mesmos.

E para aquela velha rosa, que já se viu independente e forte e pronta para desbravar o mundo dos outros sozinha e sem aquele outro que em seu coração de flor já viveu numa cúpula sob o rótulo de seu, para ela e nela existem ambas.
A primeira porque ela sente falta de ser jovem e de ter aonde ir , de saber que ainda existem lugares que ela pode ocupar, pois ainda há muito terreno a conquistar quando ela enfim e graças a Deus ou coisa parecida, crescer.
Essa falta lhe falta porque ela sente agora o peso do pedestal dourado onde foi pendurada pela vida que quis e escolheu, e hoje montada nele, ela percebe o mundo lhe esmagando e construindo seus prédios cinzentos pesados e sem alma nos frágeis dentes que ela mostra ao mundo, sua minúscula muralha de espinhos, conquistada pela vida construtora e ignorante muito mais facilmente do que por ela, que com amor os cultivou. Ela quer estar no chão e poder voar, de volta para onde não se sinta tão poderosa enfim, mas onde haja segurança. E a esperança de ter alguma certeza, de ser importante para ele que a criou e não apenas para si mesma. É esse lado que agora ela vê, por sobre o qual há não muito tempo suas folhas verdes e crescidas casted uma
imensa sombra;
Ela sabe sim o que são saudades, e sabe muito bem, e sente isso a cada vez que o vento sopra e ela pede que a derrube, para que possa ser colhida e por fim recolher-se em um lar onde lhe admirem e isso a faça viver mesmo depois de estar morta porque a terra foi tirada de suas raízes.
Mas hoje essas já são fortes demais e involuntariamente ela permanece em seu campo solitário, magnífica, e com todo esse esplendor para si, transbordando pelos olhos e pelo corpo forte e belo.

Agora a coragem..
Para assinar e decretar a própria sentença de morte, levantando-se da terra onde construiu sua cerca farpada de segurança imaginária dentro da qual se conhece forte (mesmo sem poder receber do toque de algum jardineiro o calor dessa admiração que sabe inspirar), ela precisaria refazer seu crescimento;
ao invés de tê-lo construído para o alto, para fora e em todas as direções, para todo e qualquer lado que pudessem seus botões vislumbrar, deveria ter feito uma expansão interior.
Ela arrepende-se agora (será redundante e vou dizer que inutilmente) de não ter mandado as excursões de perfume com que conquistou animais que soube, não sabe porque, manter distantes o bastante para não correr o risco de ser ferida, para dentro de si mesma.
Gostaria ela de saber como é admirar e amar e querer bem não a si, como via acontecer a cada momento, mas aos outros. Ela não soube entregar o sentimento que agora queria viver, isso ninguém lhe ensinou, isso não poderia absorver da terra que a fazia respirar nem da chuva que lhe trouxe tanto vigor. Então toda essa intensidade trancada, ela não sabe lidar com ela.
Isso queima suas mãos de rosa, ainda inábeis mesmo após tantos anos em que seus espinhos fizeram cair gotas pesadas de devotado sangue em seu canteiro.
e a rosa queria ter crescido em si para agora crescer nos outros e não se importar mais em ser, mas sim em amar e servir e fazer sorrir, não por orgulho e para se afirmar (como até então vivia e por muito tempo pensou que fosse bom), mas pela vontade humilde de deixar-se humilhar se isso lhe trouxesse a beleza de fazer sorrir, de fazer sonhar, de ser instrumento.

Mas o caminho inverso é longo e complicado.
e ela não sabe nem sente que tem lá dentro a força para alcançar esse patamar, de passaro que voa determinado, ela quer um ninho que lhe mostre a direção.
Isso pois olhando com o canto de seus olhos molhados da seiva salgada porque o coração agora bate e faz transbordar, ela se depara com as violetas
as violetas velhas e cansadas
e desbotadas, e já sem força e sem beleza e quase sem pétalas. Que são tantas.
E não estiveram em buquês, e não estiveram em janelas, e não souberam ser dos outros e foram vendo a beleza que as fazia rainha ir se despetalando pelos chãos onde seu pólen foi levado pelo vento, vento frio e de solidão.
Nunca uma abelha teve a coragem necessária para chegar ao seu alto e lindo recanto feito um trono e roubar-lhe o pólen.
Nunca um colibri lhes espalhou a fertilidade e a descendência por outras paragens.
Não deram frutos e nada deixam nas terras de onde vieram e para onde já se sentem encaminhadas, como o filho pródigo, mas sem conseguir saborear prodígio nenhum em sua curta vida de glória mansa e vazia.
E a rosa teme,
porque ainda percebe em si muita falta, e não sabe consertá-la, e não quer se tornar uma dessas violetas.

Mas o tempo talvez já planeje as primeiras investidas que persistentemente repetidas, ela teme que virão e com efeito, virão mesmo, a tirar-lhe a cor.

E rolam as pipocas

Quanto da "magia do acaso" faz parte desse monte escuro e ofuscante de tão claro que se alterna na formação de tudo o que dá beleza e fluidez à vida?
Será que isso algum dia já passou de uma invenção nossa pra justificar coisas cujas conexões nos incomodariam demais? O que isso quis dizer pra mim foi, será que tudo tem um motivo?

Por vezes prefere-se pensar que sim, que tudo está entrelaçado e seguimos, carneiros calmos e pacificamente obedientes, o caminho do rebanho que o tal algo maior (quiçá Deus) guia em direção a alguma cerca onde nossos dias de procura e frustrações não mais possam se materializar.
Mas será mesmo?
A verdade é que não sei.

Não sei como eu sentiria esse pedaço de mal estar de garganta e gripe quentes e de repente tão sensíveis e exigentes, de descanso, de lencinhos de papel, de sono, de sono, de sono, se fosse tudo semana que vem ou semana passada.
Nem mesmo posso dizer com alguma sombra de certeza se eles teriam direito ou capacidade de existir e de se fazerem vivos em mim em algum outro momento que não esse.

Provavelmente todas essas palavras, acaso, destino, caminho, certo e errado, foram criadas e fincaram raízes em alguma parte de cada um de nós por falta de como
falta de como justificar que estamos à deriva, por não saber ou por simplesmente não existir, correnteza alguma nesse gigantesco oceano bravio pintado no auto-retrato da vida.
E então a gente vai rolando e sendo navegado, sem achar a precisão de qualquer bússola, sem saber se se pode ou não confiar na previsão de qualquer oráculo ou bola de cristal.

Se a pré-condição para que as coisas aconteçam reside no eu, no aqui, no agora ou no quem é o próximo, confesso e admito que me revira o estômago e o coração admitir que não sei;
e ainda assim, sem que eu saiba, elas acontecem
E me fazem imaginar e criar histórias, e criar vidas, e criar coisas debaixo dos meus cabelos que talvez nunca existirão.
Mas lá, na segurança dos caracóis de Carolina, todas elas cabem e sobrevivem, e convivem numa magia linda que brilha e canta alto suas vitórias, de poder existir por onde eu vá e de apesar de tudo, ser um segredo só meu, impenetrável, indecifrável, que não vive para ser descrito ou adivinhável, e que pra se disfarçar, pode se tornar outras mil coisas sem estar errado ou quebrar regras. Lá toda essa vida só vive porque não tem regras.
E o importante acho que é isso,
lá, aqui,
dentro,
por dentro,
de mim
(e talvez de tudo, quem sabe)
o acaso vive.

E isso porque quando eu abri o meu casaco, antes de por o pijama, súbita e totalmente inesperadas, caíram duas ou três pipocas de cuja existência ali eu nem mesmo suspeitava, filhas de um momento já morto há algumas horas num cinema por aí.