sexta-feira, dezembro 31

Era uma vez - várias vezes,

um mergulhador, que apenas fazia o seu trabalho.
até que um dia decidiu aventurar-se

e indo um pouco mais além das profundezas onde estendera suas bandeirinhas,
descobrindo um pouco mais das névoas que permitia que lhe amedrontassem,
nadou entre flores roxas e amarelas, duvidou que estivesse realmente em alto mar. que coral é esse, meu deus?

meu deus não respondeu, mas silenciosamente deixou escapar uma.. dica
bem à sua frente estava ela. resplandecia. hipnotizado, cada bolha de oxigênio era gasta com o esforço de um bravo marinheiro entregando-se a um gigantesco redemoinho. Desejou o êxtase daquele contato.

Era simples e rara. Solitária.
Uma pérola, assim de um jeito inovador, depois de tantos sete mares percorridos, de tantas conchas guardadas, de verdadeiros segredos cuja vida superficial seria apenas passado, não fora sua obstinada vida de detetive lá embaixo.
Uma pérola sem concha. Pensou duas vezes. Quatro. Oito. Como podia ser? Não era mais grão de areia;
tanto brilhava e conquistara seu olhar, a pequena sereia esférica e muda.
E no entanto cada pérola que juntara para construir o colar que sua avó ganhou de aniversário naquele ano(amantes não couberam na Sua existência superficial), tivera que tirar da concha, desproteger. Todas as bolinhas de antes dependiam dele para serem mostradas ao mundo e para sentirem até mesmo o gosto da própria água que envolvia sua casca e sua vida. Agora, não.

Essa estava sozinha e era sozinha. Sem nada de zinha, apenas só. Na rua.
Tão frágil e ao mesmo tempo extremamente fascinante, seus cabelos loiros ondulavam acompanhando o movimento convidativo dos quadris, descobertos, dos braços, à mostra, do corpo todo exposto ao vento no olhar da clientela insone.
Cruzando de uma calçada a outra, o que ela não poderia sem a sustentação que aqueles olhares herdados ao longo da masculinumanidade lhe forneciam, era aquela aceitação a ponte onde pisava, e a pérola apoiada no coral milenar. No olhar a solidão coberta de orgulho e vaidade, tudo coladinho pela massa suja de despreocupação.
Seu próximo passo é incerto, não se sabe se o salto vai virar. Ela anseia por cada segundo, e a pérola não sabe se vai conseguir continuar secretando a si mesma; isso não é beleza, é vulgaridade, acusou o mergulhador.

Como toda hipnose essa tem fim e surpreende e deixa suas marcas, na bola que fica e no homem que passa.
E então se vê que a pérola assim nua é um erro, e apenas isso, e apenas, que pena. Que poderia ser inteira só depois da libertação, só com alguém lhe salvando a vida e fazendo bater um coração em seu peito sólido.
Nada disso veio. Nada disso teve.
Então era apenas uma pérola, então era apenas uma mulher na rua, dourada intimando com suas janelas, mais abertas para a vazia dor que carrega do que ela poderia supor.

mas como todo semáforo abre, qualquer medidor de oxigênio irá piscar.
e aí o homem vai acelerar, o que tem pé de patos, voltará para respirar,
e tudo isso vai continuar sufocando e espremendo aquela pérolamulher pra dentro de si, da própria escuridão e de tudo o que não conhece, até que instalem as devidas sinalizações em todos os perigosos e inúmeros caminhos com os quais cruza, e que em suma só levam a ela.

quarta-feira, dezembro 29

natureza, morta?

passando pela praça e vi, eu vi.
dois troncos caídos, mortos, contorcidos.
envolvidos num abraço de amor tão perpétuo como nunca foi visto antes.
daqueles galhos que apodreciam, vazava uma vontade de vida e de ser no outro tão grande
que mesmo sem aquela, esta era. estava ali.
de alguma forma aquela energia forte de uma planta pulsava naquele abraço em decomposição.
mas não era feio.
os galhos contornando os desenhos um do outro, desenhando no verde da grama e no azul do céu que se fez pano de fundo arabescos inéditos, faziam sorrir.
e enquanto tentava existir ali o que não podia ter sido, o que raízes perversas separaram por anos e anos, (no que eu classificaria como uma missão muitíssimo bem sucedida), os figurantes roubavam a cena.

é, é tão bonito ver algum amor.
um deles nascia há poucos metros. já ouviu-se dizer que eles sugavam das cascas shakespearianas toda aquela energia, mas na verdade simplesmente eram jovens e eram.
e o mundo era só deles.
e quem passasse entenderia, e entendeu.
não há o que esconda aquela entrega, que disfarçou sua efemeridade de uma vontade imensa, e fez sorrir.
e me fez querer que passasse por aqui uma brisa daquelas, que abraça, que leva, que faz-nos deixar sermos levados.
mas preciso mesmo é de um vendaval.
a esperança que não vivia mais nas folhas das árvores, postumamente realizadas, emanava do verde da camisa que ele usava, e do brilho do sorriso da menina, e deu pra pensar que naquele momento, amor era aquele. amor era aquilo. e era os dois, e era tanto, e era tudo!
e ainda assim não era eu, porque não digo meu. algo tão forte e majestoso jamais caberia num atestado de posse.

e talvez o espelho funcione agora,
e por trás de toda a fumaça velha que insiste em se acumular,
vislumbrei aqui, quem sabe, a centelha nascendo, e orei.
pra que ela saiba abocanhar com ferocidade o fogo, de lágrimas ou línguas, que a faça viver mais.

segunda-feira, dezembro 27

fraquezas

Hoje, vindo embora, lembrei-me de, mais, uma coisa que pensei.
Que preparei, quase pronta,
na ponta da língua.
E que depois, nova(e tão previsível)mente deixei a vida
me impedir de por no papel das vias de fato.

mas chega de dentro,
eis a ideia.

das minhas entranhas saem os ventos que carregam corpos com almas, e também outros desprovidos delas.
suavemente esmago-os contra o caos diário,
nos acidentes metálicos, nas hierarquias travestidas de arranha-céus, nas famílias que desabam sobre suas cabeças frágeis e vazias.
Esvazio-os.
Despejo todo o conteúdo que se possa chamar de humano no meu corpo, e quando chove em mim exalo o que se torna a terra deles, sem nenhum glamour, sem era uma vez. não se lembram de quando ou como eu era. eu simplesmente sou e sim, assim, os arrasto para dentro de mim.
Há muitas coisas que não absorvo, como esse soro de sentimento que deixo escorrer para dentro dos meus córregos pútridos, onde um dia já correu a água que me fazia viver.
Mas sei guardar muito bem, aqui mesmo do jeito que me convier, as chances, as esperanças. Encerro e quebro as escadas douradas. Meu céu é exclusividade.
deixei de acreditar no poder daquilo que algum dia alguns tolos plantaram na minha superfície. Sou alérgica a natureza.
Sou assim porque sou, na verdade, uma caixa. Guardo vaidades e interesses, e sobretudo o egoísmo majoritário. Covarde. Sei muito bem que é ele o meu médico,
e por isso devoro a quem se aproxima. Adentrar na caixa que sou é ao mesmo tempo revelar seu conteúdo de Medusa perante os olhos, e cuidado. Provavelmente você ainda não sabe escapar.
Precisam de mim. Pelo menos no verde e amarelo tenho certeza que é por isso que não rompem meus cadeados. Tolos.
Quisera eu me espalhar por aí e levar um pouco do meu negro ao verde e emprestar as minhas luzes às estrelas do campo. Seria muito mais poderosa se me ensinassem a encolher.
Por enquanto não sei. E não me dizem.
Então eu tento inutilmente deduzir essa fórmula incoerente. No caminho, vou varrendo algumas vidinhas pra baixo do tapete..
É o que custa. Gostaria de conseguir pedir ajuda. Prazer, me chamam cidade.

terça-feira, dezembro 7

Ceifando

depois que eu vi. quando eu o vi, assim, daquele jeito,
tive
de arrastar minhas implacáveis asas,
com as pontas rasgadas, quebradas e pobres, pelo chão que exala terra molhada.
E indo em direção ao coração morno que o peito cobria, desajeitado,
percebi que não dava pra senti-lo bater.
Nem mesmo de muito perto. Perguntei-me o que seria a criatura ali dentro. Quis chamá-la fria,
mas tinha mais vida do que isso. Então deixei
e como era meu dever, e disso todos sempre souberam, cravei as garras naquele frágil
peito
de onde tirei o ensanguentado quebradiço. Como batia,
que proeza. quis pra mim um igual. Eu saberia esquentá-lo, ou pelo menos assim pensava.

respingando o verde que brotou de mim praquilo que eu não sabia ter,
costurei nesse coração um pedaço de minhas assas, que guardei da época quando elas ainda eram boas.
quando alguma coisa ainda fazia valer todo o funcionamento, todo o organismo perfeito que eu era,
e a isso chamou-se bondade.
tapei de novo a nesga que teimava em entrar no poço fundo das minhas memórias, e terminei o trabalho.
senti alfaiate, senti fada madrinha, e deixei o vento cuidar da Cinderela roubada,
sonhei que ele encarregava-se de lhe por numa boa casa, com cobertor e lareira e chocolate quente no inverno.
Não sei o que lhe aconteceu.

Virei as costas para o corpo, que Agora sim era frio. E por minha causa.
Mas não posso evitar,
e como é para isso que sirvo, rumei ao próximo serviço da noite.

domingo, dezembro 5

Estranho

saber que quem poderia ver não vai,
mesmo que eu queira que queiram. cada um deve querer o seu próprio querer, bem ou mal, por si. para si ou para o mundo, tanto faz, mas decisão feita sozinha, sombra na ilha deserta da escolha que se tem, faz e dá.
não é quem diz buscar algo do tipo que virá aqui catar os caquinhos de coração,

nem mesmo por má-fé, essa ausência. talvez nem premeditada seja, apenas jeito de ser.
jeito de ser o mesmo. nem maior como eu imagino que seria, nem diferente de jeito nenhum,
ou talvez esteja mudando a cada ar que expira, sempre que vê uma borboleta que passou por mim,
rápido demais.
sempre tão rápido demais..

e você, porquê, não vai ficar como aquele gosto ruim aqui dentro,
lanço-lhe aos ventos como as cinzas do velho amado que ainda não vivi.
que os trançados do seu caminho de contorcionista mágico não desfaçam o fardo que carregas, e que te faz existir.
que o fato de ele não abrir essa caixa pública onde depositas todo dia a alma e o desejo do pulsante vermelho, não lhe faça parar de crescer e de querer ser,
para si, que seja,
aquele mais que o mundo do outro não quer.
e tudo bem.

sábado, novembro 20

lá na bolha há..

Nasceu assim, como todas nós, de um sopro.
E enquanto subia via o mundo ficar pequeno ao seu redor e engoli-la, e via o mundo que criava no reflexo curvo que saía dela e atingia os olhos dos passantes, dos brincantes, daquela que lhe fez, como todas nós.
Uma leve brisa a separou das outras bolhas, e pela deformação do mundo que via ela pôde pela primeira vez analisar seu próprio tamanho. Não soube dizer se era grande ou pequena,
certificou-se, entretanto, de que era suficiente pra ser leve e ainda assim percebida, evitando as ágeis mãos fatais das crianças que brincavam pelo parque.
Viu o fim de sua família, quando uma moça que passava correndo esbarrou no balde de água e sabão, seu berço no chão.
Sentiu o sal das lágrimas de mamãe tocarem o chão, e desesperada mirou as demais remanescentes da jornada ascendente de que participava, pensando quanto ainda duraria.
Temeu o pássaro voraz que quase a atravessou. Nessa hora, sozinha no céu, quis ser plástico, quis ser de basquete, quis ser bola de cristal e odiou o sabão que era seu corpo todo. E ainda assim, continuava.
Por vontade de quem?
Não respondeu à essa indagação que continuava dentro dela desde que uma boca a soprara pra fora de um aro. Desde que respirou o mundo no qual já sabia não poder pertencer por mais do que alguns breves segundos.
E agora os minutos decorridos lhe traziam experiências. E tão rapidamente já se sentia uma bolha ansiâ. Uma bola velha, durava amis que as outras, sentia-se cheia, preenchida por um conteúdo que não tinha criado, mas apenas deixado permear-se por suas paredes frágeis de reflexos multicoloridos que lhe garantiam tudo aquilo que tinha. Não soube se aquilo era bom
Afinal, saber de todos os perigos que sabia e que lhe permitiam ser a bolha certa, não a transformaram em nada mais concreto, e nem iriam. Seu destino era estourar e disso ela se certificava com cada nova sensação que absorvia do mundo.
Soube que todo o seu colorido, em provavelmente menos tempo do que poderia ter calculado, estava prestes a se desfazer em algumas gotas de água suja que se uniriam à enxurrada, que sujariam o sapato de alguém, e que os sorrisos que despertara nas crianças se tornariam AAAaa-não-suporto-essa-sujeira-de-São-Paulo"s com a sua fragmentação.

E que pena. Não tinha mais bolhas com as quais conversar. Nem sabia se tinha voz.
Pensou inútil toda aquela discussão silenciosa com sua própria.. tinah cabeça de bolha, mente de bolha? não não, só consigo.. Perdera a oportunidade de viver como e com as outras a sua tão frágil vida?
Tarde agora pra saber.
Tarde era, de verdade; percebeu o pôr-do-sol.
E sugou toda a vermellhidão do céu imenso que era sim seu lugar. Independeu de todo o resto e de todas as outras, e de tudo aquilo a que não tinha dado tempo de se prender.
E pela primeira vez, quis olhar para o alto. E olhou.
Lá embaixo, alguém sentiu uma gota pesada cair na testa. Limpou irritada o pouquinho de maquiagem que escorria, que saco, parecia sabão, aquilo era à prova d'água!
E mais nada.

quarta-feira, outubro 27

Ela ganhou um diário de presente.

Tudo bem, sem presunção.
Não era um diário e apenas um caderno em branco.
Não era ela e apenas eu.
Na verdade, não se sabe nem mesmo se foi um presente ou um achado. Talvez uma daquelas heranças do destino, que caem na cabeça de algum desavisado no dia seguinte da sua grande decisão de não ficar mais esperando por elas.
Seja qual for o título certo, caiu em suas mãos frágeis de criança sedenta de mundo um montão de folhas, limpas e pautadas, charmosamente unidas por um fio rosa de cetim que faz lembrar até hoje o cheiro de vó da casa onde a diversão foi sempre tão lei quanto o amor.
E ela o abriu, mergulh. [calma; agora voltando para a decisão de que era apenas eu, porque era mesmo afinal de contas]. Eu o abri, mergulhando nas páginas tão virgens quanto o que eu conhecia da vida ou de mim. E foi lindo aquele amor à primeira vista, e foi instantâneo. E a dona do cheiro da casa mágica e maluca me ensinou a bordar os rabinhos de porco no começo e no final do elefante, e me ensinou a desenhar o nome mais bonito do mundo, e me contou que era meu.
Desde então eu possuí esse caderno, esse diário, muito mais do que eu pensava. E agora quando ele está prestes a se fechar (queira Deus que tardiamente), certamente bem depois de vários outros que as velhinhas donas de outras casas cheirosas deram para os seus pacotinhos, é que dá pra ver o quanto ele foi usado, rabiscado, castigado pelos risos ferozes e pela brutalidade das chuvas salgadas abafadas no travesseiro.
O tempo inteiro,mesmo quando escrever fisicamente foi ficando pra depois e eu pensei ter trancafiado o caderninho em algum baú empoeirado do quarto também cor-de-rosa que só pode ser o seu lugar, ele estava sendo usado. A todo momento, numa silenciosa argumentação travada comigo a cada dia.

Nele eu escrevi minha infância.
Tchau, caderninho. E muito obrigada.

terça-feira, outubro 5

E eu

Querendo, numa esquina qualquer desses caminhos que a vida ou o "acaso" escolhem pra gente, topar com um anjo, um assim bem inesperado, que presenteie meu sorriso com uma asa que traz a tiracolo. Asa sua, primeira, estimada, roubada de um canteiro de secar asas num subúrbio da sua cidade, inestimável, cintilante, recem comprada, que transpire a cada bater a vasta experiência cravada nos detalhes-defeitos de suas penas tortas.
E pensando que ele silencioso apenas entregaria-me o divino presente, com toda a naturalidade que se imagina inerente a sua pureza angelical, e me dirá que a use bem. E que não pare de sorrir, como o par alado cujo trabalho não vai cessar nem quando a ultima pena cair. Nesse momento em sua mente ele me vera livre como a pomba que imaginou trazendo a paz de meus alvos dentes num ramalhete de esperança, eterna centelha que tudo preenche.
E, como venho querendo já há certos instantes, me dará sua mão e também o céu num beijo de despedida. Deixo o amigo momentâneo mas o carrego nas asas que eram com ele e que agora são em mim o eu que toca o mundo de cima, mundo leve e claro como num sonho, e no qual farei real qualquer desejo meu. E após ver bem tudo o que me apetece, e apreciar a beleza de muitas flores vivendo e murchando e voltando a ser Terra e famílias crescendo e outras se rasgando e corados cansados e secos, rejuvenescerem a trilha sonora tão conhecida de mais um capítulo no livro dos amores; tendo já as asas maiores que o céu que me carrega e o estômago farto de tanto devorar o banquete da vida num mundo onde pus meu coração e o fiz florescer, deixarei que ele mande em mim.
E me coloque mais uma vez no caminho de onde vim, mas no novo espaço que agora me pertence, do pleno descanso harmonioso do silencio do condomínio eterno, onde as asas brancas tentarão (quem sabe em vão) nascer em lírios, mas não eu, não.
Eu deitada verei que o que fiz foi bom, direi a meu anjo ate logo e outras palavras magicas de que o julgue merecedor, e me deixarei ate que enfim ser vento, e o tempo apenas ser.

domingo, agosto 15

,Sucessão

Hoje vou sair.
Vou sair e nascer como uma estrela, e brilhar como uma flor.

Se as raízes de tudo o que quero aquecer e transmitir ao universo escuro profundo e soberano, aquele que às vezes profano se apodera de mim e tampa minha luz arriscando um incêndio imenso, vingarem na terra incerta sem piso e sem segurança que é o desconforto de viver e de ser estrela, então o orvalho da noite quente que absorve o mundo e suas angústias me abençoará.

Quando enfim cair sobre um corpo vivo e latejante uma nesga da minha luz, distante, sentirei como pela primeira vez a utilidade. A utilidade que já se provava forte e decidida dentro da minha minúcia de grão quando toda a explosão que agora parte de dentro do meio de mim ainda era reclusa em uma pequena cápsula brilhante e discreta, e esquecera-se de que tinha dentro de si todo o poder e o fogo de uma estrela-flor.

Então minha noção e meu sentimento se expandirão e perceberei como atinjo tudo, perto e distante. Como minhas raízes flutuam e penetram os mistérios do céu maravilhoso e reviram a terra que tenta cobrí-las, e são notadas pelos passantes por cima delas, e modificam com sua delicadeza o asfalto, que se julgava soberano. Como meus raios chamam e puxam coisas e planetas que se aglomeram e organizam e passam a viver em função da minha existência de estrela, e eu poderei girar apenas em torno de mim mesma, e não sair, mas ficar e fazer saírem, e ter vidas que levem minha vida a outros cantos, e ter cantos onde minha vida chegue e se espalhe como um perfume pelo qual se espera sem saber há muito, há tanto, há quanto tempo?

quarta-feira, julho 28

artesanato.

quase todas as vezes,
a gente simplesmente acaba sendo o que não queria
e eu espero que tudo o que falta
seja um pouco de movimento,
pra tirar de toda essa louca energia
a capacidade e a chance de criar um pouco de alegria.

de novo, de novo, de novo

e mais uma vez parece realmente e com força que a vida se repete na estação.
em cada estação, em tanta estação, nas muitas e talvez nas todas estações que dentro de mim se transformam violentas e súbitas, entrelaçadas na confusão que faz fundirem-se suas identidades, e as vezes morrem antes mesmo de deixar um suspiro concreto no mundo, uma prova de que um dia existiram.

de toda aquela vida e brutalidade que borbulha e aflora lá dentro no quente do peito, raramente ou quase nunca sobra alguma faísca pra contar a história em um sorriso ou lágrima ou coisa parecida.
é essa terrível fortaleza de mansidão, que combate com toda a sua calma e harmonia cada rebelde emoção que queira marcar com o tempo e as frustrações do amor e da vida a sua face de princesa.
são caladas, o volume de suas vozes implacavelmente diminuído, até que por fim acabem morrendo, longe de vislumbrar a luz do mundo de verdade, afogadas na alma que habita o corpo solitário, reféns da vergonha de ser.
será que algum dia elas conseguirão transbordar?

por enquanto continuam insistindo, modestamente revoltadas porque sabem ser escravas de onde moram, e não sabem ainda se nasceram do corpo ou da cabeça ou do coração. não têm a quem reclamar e ainda não conhecem o mundo para poderem reivindicar algum lugar nele.
mas onda após onda, continuam insistindo.. continuam vindo.. duvidam da própria força na maioria das vezes.
e acontecem sempre. e de novo, e mesmo onde se acreditou que o veneno matara todas as ervas daninhas, o sentimento não. em toda a sua fúria, não, ele ainda está lá. E como o vento se transforma, e quando então é brisa suave, até que seu familiar aroma em uma rua qualquer que não reconhecemos à luz do dia, ou em algum daqueles lugares de que sentimos saudades sem nunca ter adentrado, trará novamente à tona toda a bagunça.
a palpitação e a dúvida e as ideias e as ideias que se sobrepõem se sufocam e se julgam tudo dentro de nós tudo rápido e intenso e maravilhoso e principalmente e sempre assustador.

PARE
naturalmente não haveria rédeas pra segurar a força do mar de dentro em um dia de ressaca, em que sua racionalidade se revelasse grande e decidida e em explosão as ondas tomassem conta de todo o resto. e levassem embora toda a calma, tudo o que se construiu durante muito tempo.
então de novo os carrascos de tudo, os medos.
virão e afogarão as rebeldes ondas em si mesmas, sabem bem como por tudo em ordem.
mas que ordem é essa.
ordem de inverno, morta e sem sabor.
até quando tudo isso vai se repetir, essa ideia de que se deve ou pode trancar tudo? porque não deixar o barco à deriva, abrir o caminho para a explosão de tudo que acaba trancafiado no escuro e assim evitar que na receita de qualquer saudade exista alguma pitada de arrependimento ou de vontade que ficou?

todo esse frio trancado é a morte.
por favor, alguém que ouve, deixe que algum dia venha toda essa exuberante liberdade.

quinta-feira, julho 8

Ontem, na verdade

bateu essa vontade de ser menos.

menos eu, menos o que querem que eu seja, menos do que eu quero tanto ser.
menos viva, menos morrendo mais a cada respirar, menos intoxicada ao respirar sujeira material e espiritual do mundo que me cerca, menos nesse movimento incessante em lugar nenhum.
menos perdida.
menos diferente de tudo que eu entendo e sei definir, menos eu.
menos do que dizem e eu penso que me consideram ser, menos do que os outros que eu quero poder admirar e não consigo mais, não dá, menos eu.
menos do que eu serei amanhã e também menos do que eu fui ontem. menos do que eu estou me tornando e até mesmo menos do que eu sou nesse exato momento.
menos do que o instante de consciência em que se percebe ter algum valor, e então poderia ser livre novamente, como quando era menos, menos eu.

E com certeza tanta súbita e curta vontade faz parte de um desejo de voltar, e de não me sentir eu ou mesmo de não me sentir nada,
para que se possa querer de novo ser mais, e esparramar por aí as gigantescas asas,
e voltar a crescer.

quarta-feira, julho 7

Pra que nos deixemos ser mais

Já vou logo avisando de prólogo, que esse daqui talvez seja bem pouco, senão in,compreensível.

*

Uma coisa que muito me incomoda e pode-se até dizer que me irrita bastante, é o eu não saber o limite da superficialidade.
Quer dizer, e quando as luzes se acenderam antes do que se esperava, e se por dentro já fosse tudo claro e então ficasse mais claro ainda, nessa hora alguma força bruta e maior nos impede de chamar aquilo que queima de sentimento?
Sei sim, e penso ser necessário a muitos de nós, reconhecer a escuridão dos lugares aonde se vai e pelos quais vive-se a vida; mesmo assim não quero deixar de viver e acreditar naquilo que uma voz singela e tímida, que podemos fazer facilmente passar despercebida, nos murmura no semi-vazio calabouço das ideias....
...é de verdade...
e como poderia não ser de verdade tudo aquilo que faz, nem que seja por apenas um segundo, palpitar apressado um coração?
e no entanto ouço e percebo que não pode ser, que não deve ser, que não deixam nem deixamos ser...
É essa linha tortuosa que pensamos tênue, e se revela dura e afiada como o arame mais farpado ao menor toque, à menor pressão, ao mais efêmero lampejo de desejo de mudar de lado por um instante. Onde acabam-se as condições de continuar sendo assim, simplesmente tão.. superficial.
e mentiroso.

Sim,sim.
Mente-se a si mesmo nesses becos escuros, nesses cômodos barulhentos em que os murmúrios dos anjos bons e de nosso próprio lado puro vêem-se desesperadamente inaudíveis. E exasperam-se na tentativa de se fazerem ouvidos, na tentativa de que um tropeço pisada no pé bronca ou empurrão nos façam ver que, lá, nada enxergamos de verdade.
Mas não queremos ouvir os sermões chatos que eles nos passam. Não, a música vale mais a pena no momento. O momento, o momento.. quanto deixamos para trás pelo mero e (in/f)útil prazer do momento.. me intriga incomoda e irrita não ter a mínima noção de se algum tanto desse quanto é recuperável, de se podemos ou não ter de volta aquela pureza e aquelas vozes; e se sentimento algum dia viverá em quem não soube ouvi-lo ou cedeu às pressões do mundo de não aceitá-lo, ou simplesmente não o fez porque realmente a distância é mais confortável.

Alguma parte do que tinha aqui dentro pra crescer e sair e arranhar o mundo já se foi.
E a forma que tudo isso tomou do lado de fora não era a que eu queria, por mais que assim se pensasse, nas horas de rebentação. Por mais que se conformasse em se ser o que é, em estar aonde se está, em conviver com quem conhecemos e aceitá-los, assim mesmo..
Não se trata de compreender o outro nem de acompanhar quem precisa de nós, algo que faz parte da caminhada de quem não quer caminhar sozinho e eu tomarei enquanto puder como meu compromisso e com prazer;
mas de quanto deixamos de lado de nossas próprias crenças e motivações e talvez até princípios, nesse caminho, é o que me incomoda e me irrita tanto.
Porque realmente não vem de mim e eu sei que não é pra mim toda essa bagunça. Quer dizer, tem que haver outras formas de extravasar a energia da alma pro mundo de algum jeito que ela só seja BOA. e linda;
E que não incomodem e que não nos obriguem a enxugar as lágrimas quando olharmos para trás.
E que não nos obriguem a andar com pressa, a falar rápido, a esquecer, a se conformar com o mundo que sufoca nosso peito apressado e nos manda pensar que é tudo assim mesmo.
E que nos permitam não ter as experiência e os dissabores da idade do nosso corpo mas viver aquilo que sentimos com o tamanho que tiver do lado de dentro.
E que nos deixem estar onde isso tudo possa emanar e se propagar tanto quanto queremos e sabemos que sabemos fazer e talvez até bem.
E que nos mostrem onde não precisamos de capas de normalidade nem de convenções sociais que nos cortem os pedaços e nos deixem com os restos de quem somos, aos poucos, migalhas de nós, pra poder sorrir e permanecer.
E que nos desamarrem enfim de todas essas apreensões intrigantes e irritantes e todos esses medos inúteis que sentimos de nos deixar voar. Para que enfim partamos rumo a onde o pulsar do amor e do sangue nos impulsionarem e aos lugares onde sempre quisemos ser apenas o que temos por dentro, sem casca, sem cobertas, sem receios, só nós mesmos de cara pro mundo e nus de aperfeiçoamento. Apenas nossa própria essência exalando o que nenhum perfume pode imitar e não precisar de roupas de nenhuma natureza que nos protejam do julgo dos olhares assassinos porque lá eles não cabem. Só cabemos nós mesmos, e todo o amor que as noites escuras absorveram de nós, que vai voltar, e vai sair e ir, dessa vez apropriadamente destinado aos nomes que escrevermos no verso do envelope;
que pombas brancas solenemente carregarão, compreensivas e amáveis, aos quatro cantos do mundo.

terça-feira, julho 6

Há tantas violetas velhas, sem um colibri

É a falta.

É a falta em dois sentidos,

tanto como algo que vem de dentro e nos corrói, e a faz querer correr atrás do que deixou para trás e o trazer de volta, como se o antes fosse o presente e o futuro, mesmo depois de seu vaso ter sido despedaçado tantas e tantas vezes... (aka saudades)
como quando nos falta a coragem pra atirar aos quatro ventos o grito de partida dessa corrida desvairada e animalesca que nos leva até as coisas que mais queremos, e portanto em relação às quais nos vemos e consideramos mais incapazes de qualquer atitude grande que resolva tudo do jeito que nos permitimos sonhar visualizar e desejar com esperança durante as noites solitárias em que deixamos brilhar a luz do amor de nossa imaginação sobre nós mesmos.

E para aquela velha rosa, que já se viu independente e forte e pronta para desbravar o mundo dos outros sozinha e sem aquele outro que em seu coração de flor já viveu numa cúpula sob o rótulo de seu, para ela e nela existem ambas.
A primeira porque ela sente falta de ser jovem e de ter aonde ir , de saber que ainda existem lugares que ela pode ocupar, pois ainda há muito terreno a conquistar quando ela enfim e graças a Deus ou coisa parecida, crescer.
Essa falta lhe falta porque ela sente agora o peso do pedestal dourado onde foi pendurada pela vida que quis e escolheu, e hoje montada nele, ela percebe o mundo lhe esmagando e construindo seus prédios cinzentos pesados e sem alma nos frágeis dentes que ela mostra ao mundo, sua minúscula muralha de espinhos, conquistada pela vida construtora e ignorante muito mais facilmente do que por ela, que com amor os cultivou. Ela quer estar no chão e poder voar, de volta para onde não se sinta tão poderosa enfim, mas onde haja segurança. E a esperança de ter alguma certeza, de ser importante para ele que a criou e não apenas para si mesma. É esse lado que agora ela vê, por sobre o qual há não muito tempo suas folhas verdes e crescidas casted uma
imensa sombra;
Ela sabe sim o que são saudades, e sabe muito bem, e sente isso a cada vez que o vento sopra e ela pede que a derrube, para que possa ser colhida e por fim recolher-se em um lar onde lhe admirem e isso a faça viver mesmo depois de estar morta porque a terra foi tirada de suas raízes.
Mas hoje essas já são fortes demais e involuntariamente ela permanece em seu campo solitário, magnífica, e com todo esse esplendor para si, transbordando pelos olhos e pelo corpo forte e belo.

Agora a coragem..
Para assinar e decretar a própria sentença de morte, levantando-se da terra onde construiu sua cerca farpada de segurança imaginária dentro da qual se conhece forte (mesmo sem poder receber do toque de algum jardineiro o calor dessa admiração que sabe inspirar), ela precisaria refazer seu crescimento;
ao invés de tê-lo construído para o alto, para fora e em todas as direções, para todo e qualquer lado que pudessem seus botões vislumbrar, deveria ter feito uma expansão interior.
Ela arrepende-se agora (será redundante e vou dizer que inutilmente) de não ter mandado as excursões de perfume com que conquistou animais que soube, não sabe porque, manter distantes o bastante para não correr o risco de ser ferida, para dentro de si mesma.
Gostaria ela de saber como é admirar e amar e querer bem não a si, como via acontecer a cada momento, mas aos outros. Ela não soube entregar o sentimento que agora queria viver, isso ninguém lhe ensinou, isso não poderia absorver da terra que a fazia respirar nem da chuva que lhe trouxe tanto vigor. Então toda essa intensidade trancada, ela não sabe lidar com ela.
Isso queima suas mãos de rosa, ainda inábeis mesmo após tantos anos em que seus espinhos fizeram cair gotas pesadas de devotado sangue em seu canteiro.
e a rosa queria ter crescido em si para agora crescer nos outros e não se importar mais em ser, mas sim em amar e servir e fazer sorrir, não por orgulho e para se afirmar (como até então vivia e por muito tempo pensou que fosse bom), mas pela vontade humilde de deixar-se humilhar se isso lhe trouxesse a beleza de fazer sorrir, de fazer sonhar, de ser instrumento.

Mas o caminho inverso é longo e complicado.
e ela não sabe nem sente que tem lá dentro a força para alcançar esse patamar, de passaro que voa determinado, ela quer um ninho que lhe mostre a direção.
Isso pois olhando com o canto de seus olhos molhados da seiva salgada porque o coração agora bate e faz transbordar, ela se depara com as violetas
as violetas velhas e cansadas
e desbotadas, e já sem força e sem beleza e quase sem pétalas. Que são tantas.
E não estiveram em buquês, e não estiveram em janelas, e não souberam ser dos outros e foram vendo a beleza que as fazia rainha ir se despetalando pelos chãos onde seu pólen foi levado pelo vento, vento frio e de solidão.
Nunca uma abelha teve a coragem necessária para chegar ao seu alto e lindo recanto feito um trono e roubar-lhe o pólen.
Nunca um colibri lhes espalhou a fertilidade e a descendência por outras paragens.
Não deram frutos e nada deixam nas terras de onde vieram e para onde já se sentem encaminhadas, como o filho pródigo, mas sem conseguir saborear prodígio nenhum em sua curta vida de glória mansa e vazia.
E a rosa teme,
porque ainda percebe em si muita falta, e não sabe consertá-la, e não quer se tornar uma dessas violetas.

Mas o tempo talvez já planeje as primeiras investidas que persistentemente repetidas, ela teme que virão e com efeito, virão mesmo, a tirar-lhe a cor.

E rolam as pipocas

Quanto da "magia do acaso" faz parte desse monte escuro e ofuscante de tão claro que se alterna na formação de tudo o que dá beleza e fluidez à vida?
Será que isso algum dia já passou de uma invenção nossa pra justificar coisas cujas conexões nos incomodariam demais? O que isso quis dizer pra mim foi, será que tudo tem um motivo?

Por vezes prefere-se pensar que sim, que tudo está entrelaçado e seguimos, carneiros calmos e pacificamente obedientes, o caminho do rebanho que o tal algo maior (quiçá Deus) guia em direção a alguma cerca onde nossos dias de procura e frustrações não mais possam se materializar.
Mas será mesmo?
A verdade é que não sei.

Não sei como eu sentiria esse pedaço de mal estar de garganta e gripe quentes e de repente tão sensíveis e exigentes, de descanso, de lencinhos de papel, de sono, de sono, de sono, se fosse tudo semana que vem ou semana passada.
Nem mesmo posso dizer com alguma sombra de certeza se eles teriam direito ou capacidade de existir e de se fazerem vivos em mim em algum outro momento que não esse.

Provavelmente todas essas palavras, acaso, destino, caminho, certo e errado, foram criadas e fincaram raízes em alguma parte de cada um de nós por falta de como
falta de como justificar que estamos à deriva, por não saber ou por simplesmente não existir, correnteza alguma nesse gigantesco oceano bravio pintado no auto-retrato da vida.
E então a gente vai rolando e sendo navegado, sem achar a precisão de qualquer bússola, sem saber se se pode ou não confiar na previsão de qualquer oráculo ou bola de cristal.

Se a pré-condição para que as coisas aconteçam reside no eu, no aqui, no agora ou no quem é o próximo, confesso e admito que me revira o estômago e o coração admitir que não sei;
e ainda assim, sem que eu saiba, elas acontecem
E me fazem imaginar e criar histórias, e criar vidas, e criar coisas debaixo dos meus cabelos que talvez nunca existirão.
Mas lá, na segurança dos caracóis de Carolina, todas elas cabem e sobrevivem, e convivem numa magia linda que brilha e canta alto suas vitórias, de poder existir por onde eu vá e de apesar de tudo, ser um segredo só meu, impenetrável, indecifrável, que não vive para ser descrito ou adivinhável, e que pra se disfarçar, pode se tornar outras mil coisas sem estar errado ou quebrar regras. Lá toda essa vida só vive porque não tem regras.
E o importante acho que é isso,
lá, aqui,
dentro,
por dentro,
de mim
(e talvez de tudo, quem sabe)
o acaso vive.

E isso porque quando eu abri o meu casaco, antes de por o pijama, súbita e totalmente inesperadas, caíram duas ou três pipocas de cuja existência ali eu nem mesmo suspeitava, filhas de um momento já morto há algumas horas num cinema por aí.

quarta-feira, junho 23

o troféu e seu casco.

e se o que se é estiver mesmo pairando em algum ponto do lado de fora?

como faz a tartaruga?!
sua corrida foi penosa e lenta e a mais rápida aventura que seu coração já sentiu fazer bater.
suas pernas cansadas se relembram de como não ficar parada, apenas disso ela se recorda.
nada de viver, apenas não parar. ela seguiu e conseguiu o que tanto queria.
o que mesmo ela tanto queria?
agora que o tem, que quer que lhe tenha sido assim tão querido por um instante ou dois, não se sente mais porque agora não é desejo, é realização e essa chama não queima, apenas perdura.
sobrevive.
mas ela quer viver. ela quer lembrar-se do que é não ser o algo a mais que a empurra passo a passo rumo à linha de chegada, esquecer-se de que agora se tornou tartaruga de novo e apenas isso que é. sem enfeites, sem abraços, sem merecimento.
apenas velha e cascuda e dura, e agora cansada.
mas com algo nas mãos pelo que foi alguma coisa diferente. por alguns momentos de intensidade, ela respirou aquele troféu que não via,
mas ele viveu dentro dela.
e agora que está em suas patas largas, todo seu e tão seguramente conquistado, tem dono,
e por isso já não mais lhe pertence,
não faz parte de seu desejo e não lhe desperta movimento. revê o coelho perdedor.
quisera ela saber agora, lembrar tão bem quanto lembra do saltador em dormição por quem passou, traiçoeira sorrateira e triunfante, por que quisera tanto aquela sensação,
que não aprendera a sentir.
não sabia ser a dona do prêmio, não sabia sentir o primeiro lugar. sabia querê-lo, e nisso era mestre.
era mestre em crer que iria avançar a despeito de sua casca pesada, e em torná-la leve de convicção e de garra, mesmo sem ter dentes ou coisa parecida.
seu casco.
por ele não conseguiam mais entrar as remanescências do que fora no percurso, e que agora altaneira no pódio máximo, desejara saber por qual parte do caminho tortuoso estariam perdidas.
o casco a bloqueava do mundo que precisava respirar para se tornar algum bicho mais dinâmico, mas deixava entrar o poder da vitória que a envolvia e incapacitava.Era filtro potente de coisas pelas quais seu coração vibrava, mas não sabia ainda se defender da luz dourada que continha em suas 'mãos'.
viveu aquele segundo de invejada glória como um parasita alojado em seu troféu reluzente.
pensou sério em deixá-lo cair, e vendo o símbolo estourar, quem sabe estourasse também a bolha de ar manso que havia tirado seu apetite pela vida e pela vitória que não possuísse.
pensou também em inovar, apavorando os espectadores com seu lado mais negro e, vazando de ferocidade, mandar todos os falsos admiradores para suas casas de solidão.
pensou também no que era, e não o sabia. pensou que talvez devesse achar melhor simplesmente aceitar aquele troféu, afinal o merecia, e tornar-se o que ele bem entendesse em fazer dela. pensou. e pura e desesperadamente.

e agora,
como faz a tartaruga?

num aquário

não faz mal se tiver um pouco de amor demais.
ou um pouco de dor demais, de gritos e choros e espancares o ar inocente, enfurecida.
não faz mal a ferida aberta e o sal que viver e suas lágrimas derramam sobre ela.

se o mendigo é capaz de sorrir enquanto torna-se parte da paisagem, não faz mal.
se a flor pisoteada ainda encontra abrigo na terra e dela tira a força de cedro para continuar a nos deixar respirar, mal não há.
se em qualquer parte uma criança que seja ainda acredita, mal não tem.

tudo ficará bem, e as novas cores de ventos recém-nascidos tragarão o que de frio deixamos crescer dentro de nós,
e rolando como as ondas irão perder-se no fundo de algum aquário antigo , incapaz de prender qualquer atenção importante, as feridas, o amor, os inocentes, a flor e o mendigo e a criança.
e a vida.
anônima e despercebida pelos transeuntes.

Um resto

e agora é tudo feito de adeus.
sobram pedaços de pétalas pisoteadas e cuspidas, arrancadas e lançadas pelo chão da sala.
sobra meu ventre natimorto em que o amor foi cuspido na primeira suspeita de trapaça,
que se viu mais só do que já era antes, assim que não foi mais capaz de enganar-te.

a infertilidade das palavras doces e dos gestos débeis com que você me contaminou,
a vontade de não me ser, mas a ser, ser o lindo ser que é a brisa suave que faz seu catavento querer ser soprado para seus lados, ser os raios que o seu girassol segue involuntaria e apaixonadamente.
a raiva do que existiu e da concessão muda que se fez com cada sorriso, de que o meu corpo te pertenceria o quanto entendesses e as correntes seladas entre nossas almas, eram eternas e só suas.

saber que as palavras fortes nunca terão a violência e a fome do peito carcomido pelas lembranças nauseantes, embalsamadas e amortalhadas num falso e frágil pacote podre de amor.
esse peito que grita em seu silêncio que mil mundos não conseguiriam decifrar.
esse peito que nem peito mais sabe se é ou não.

esse peito que viu seu calor de primavera passar, e quieto, sobrou na multidão.

comandante surdo

qual mesmo o sentido de se querer justo esse amor que é surdo?

ele não tem ouvidos para o que lhe ordenamos,
é um rosto feito de boca e olhos. Fechados para a alma do outro, abertíssimos para o coração desse mesmo pobre diabo, que os admira boquiaberto. Não consegue negar.
são belos os olhos do amor.
o amor não cheira o gosto salgado das lágrimas do outro, não não.
ele apenas sente com delícia seus poemas apaixonados e regojiza-se vitorioso.

é ele que queremos e é a ele que aceitamos quando volta sem permissão.
sem aviso nem data marcada.
sem a menor preocupação. ele não ouve se nossos passos já lhe ultrapassaram.
se julga nosso semelhante,
sem querer enxergar que é carrasco.

E VOLTA
dotado de tanta despretensão quanto o mais ambicioso dos corruptos.
e desvirgina mais uma vez os olhos do outro, que tinham reaprendido a olhar a vida com inocencia.
e profere mais uma vez as palavras malditas, que tiram o sono do outro e pousam-no na estante dourada e macia do amor.
e surdo, guarda sua cobaia de (alguma)estimação, na gaiola suja que disfarça de palácio.
e não deixa espaço para não, não há lugar em seu rosto de beleza estática e gelada para perguntas, não sabe responder. só sabe cativar, sem garantia nenhuma. aprendeu a convencer a cada nova vez que se repete, que é aquilo que o outro quisera e imaginara desde o princípio.
e o segura.

E VAI
desmoronando com sua partida a prateleira, a escada, o coração, a boca, os ouvidos, os olhos mais uma vez vidrados e o coração de novo tornado em pedra.
deixando tudo o que não se quer, todas as cicatrizes inescondíveis que atiçam a memória.
queimando no seu gado marcado o sorriso maligno, a boca de dentres podres e satisfação venenosa. mais uma vez ele venceu.
como sempre, ele venceu.
elegante e sorrateiro, ele venceu e sua ida já o levou para longe.

e o outro, e o amor, e qual seu fim?

não termina.
quando se cansar de ir e vir, e por fim largar as cartas, soltar a âncora, pronto e confiante de que atracou seu grande navio repleto dos tesouros de pérolas que arrancou das ostras de pureza dos outros,
não estará em porto seguro.
se tornando o proprio outro, perdido em um rosto-rodamoinho maior do que seu sorriso-barco,
girando por tempo indeterminado em alguma parte do fatídico mar, muito mais poderoso do que seus ouvidos surdos e muito menos suscetível a mudanças do que seus olhos calculistas e deliberados, e dissimulados.

se um dia o barco não naufragar
sairá cheio da colérica vingança com que foi inundado.
e sua tripulação de olhos e bocas e palavras sórdidas continuará em busca dos ouvidos que o crocodilo engoliu,
exausta e persistente
inevitavelmente(será assim alguma coisa?) desejando nunca ter contaminado o outro com suas doentias vilanidades de amor.

começo .

sim, não.
sim, é obvio que nao poderia sair só de si próprio tudo que na vida se jorra por aí ao vibrar o ar que se respira.
não, não sei ainda, até onde vai esse poder dos outros de nos fazer alguém outro, o outrém.

morre algo dentro da alma que sorri falsamente,
quando atônita ela imagina o que há por debaixo da capa,
o que ainda existe dela mesma, morando pelos cantos sujos da casa abandonada que é o apenas ela, que é o que o mundo não deixa ser, que é o que talvez nem seja mais,
não a deixa descansar em paz.

como pode dormir e arriscar que a máscara caia,
como não agarrar-se constantemente aos fios dessa capa de mundo e de outros que já faz tão parte dela?
COMO

silenciosa ela segue sabendo que ninguem lhe dirá.
nenhum grito lhe denunciará as escaras na face quando o vento soprar para longe sua falsa pele, já tão parte dela;
ao menos não à sua frente.
o mundo continuará girando enquanto lhe observarem pelo canto dos olhos, ardendo em carne viva,
seu sentimento à mostra, seu coração palpitando do lado de fora.
Ela mesma, e pela primeira vez nua. Despida e livre do que os outros a tornam.
também é escrava disso, de ser só,e apenas o que é, agora que não pode mais a volátil versatilidade que a sintonizava chave mestra da porta humana que escolhesse.

e a alma caminhará,
pois não lhe ensinaram a parar.
Até que se depare com o olhar que aguarda e cuja sede lhe impulsiona as pernas fatigadas,
e uma criança lhe olhará, e sentirá tristeza por ela
e perguntará à soberana o motivo de sua nudez
compartilharão um secreto momento, unidas porque não têm vergonha.

uma que nunca soube ser senão o que é, simples lagarta
e a outra borboleta desalada, humilhada e traída e roubada pela ida da vida dos outros, que um dia lhe deram uma capa pra vestir e esqueceram-se de atá-la bem, deixaram de protegê-la das intempéries do caminho.

mas da criança ainda se lembram,
e a mãe virá correndo, estilhaçando a cumplicidade cristalina da amizade instantânea que não dura mais do que o tempo que levou pra se consagrar.
isso porque não pode ser,
e terá o dedo do ventre protetor apontado para suas feridas abertas,
empurrando brutalmente os corações amigos em sentidos opostos.
ensinando à criança o medo, a vergonha, a urgência de esconder o que se sentiu e não podia ser.

suja e humilhada ela re-ergue o olhar tão recém-nascido e sacode-lhe a poeira.
"EU ensinei uma lição".
a alma continua em galope pelos trilhos que ineditamente ninguém lhe emprestou.
eles lhe pertencem,
e ela respira completa pela primeira vez.

domingo, junho 13

ANONIMO (ou confessional e coletivo?!)

Amar é como
voar!

É sentir a sensação de estar no
alto
,
é ter medo de cair!

É fazer dos pesadelos sonhos,
e sentir-se
pequenino
perto de quem ama!

É sentir-se grande ao se saber amado.

Sem música

talvez pra começar, talvez antes, talvez como prelúdio do precipício exercitante do pensamento.
mas por favor, pelo menos a mim, não me venha com 'música para escrever'
se já me é desgastante o bastante o tentar desembaralhar todos os acordes primitivos, as vezes malformados e as vezes, ainda, até, guturais, das ideias que me vem e que esperam que eu as lace, as vezes meu leão, as vezes meus cordeiros - desnecessariamente oficializarei que prefiro as feras -, e domá-los ou ordená-los em frases, fazer com que todos eles caibam em linhas.

É que fazer isso aqui já é tentar ouvir a própria musica, que toca mais baixo do que estamos acostumados a ouvir, esperando calma e cheia de desejo que desconectemos os fones de fora e permitamos que funcionam e desenferrujem-se os de dentro, e que os sons possam começar então a sair,

boanoite.

muita graça

me canseeeei de lero-lero; dáááá licença mas eu vou sair do sério.
quero mais saúde; me cansei de escutaaar
opinião
de como ter um mundo melhor, mas ninguém sai de cima nesse chove-não-molha
sei que agora eu vou é cuidar mais de miim

hooOo hoOu

Como vai? Tudo bem? Apesar, contudo, todavia mas porém
As águas vão rolar, não vou chooorar (não).
se por acaso morreeer do coração,
é sinal que amei demais
Mas enqanto estou viva, cheia de graça, talvez ainda faça
um monte de gente feliiiiiiiz !

Então só por agora vou fingir que Ana só significa cheia de graça e que cheia de graça só significa Ana, e que essa então sou eu, sem nenhum alteração, sem nenhuma Carolinagem, só Ana calma e tranquila e como sempre, sem hesitar, sem resistir. E você vai deixar.
E o que custa se fingirmos nós dois, nós todos eu e vocês meus pedaços que somos só isso, como nos vemos agora e como a música nos faz sentir a vida que tangenciamos. Sim, porque algo tão puro e constante eu não vejo como teria aptidão ou oportunidade para entrar na vida e pertencer à sua circunferência mas somente para tocá-la, se é que e apenas enquanto fosse capaz, ainda que apenas disso. Quem sabe observar da vitrine, os manequins animados interagindo e levantando e caindo e dormindo e acordando e sempre alegres e tristes, geralmente ao mesmo tempo e em lugares diferentes de si próprios. Mas como são impróprios, pensaria essa Ana toda branca, sem nunca dizê-lo, ela não magoa, ela não demonstra, ela apenas graça. Pobrezinha.
Será que um dia saberá o quanto é bom tropeçar por esse tortuoso desenho perfeito em forma da linha curve infinita que nunca cansa de se repitir? E quando o ciclo acabar, estará ela pronta para se enveredar mais uma vez por suas florestas repletas de espinhais e carrapichos e feras à espreita a cada curva subita que a trilha dá? Seria a cheia de graça capaz de não ir pela trilha, uma vez que foram outros pés que a traçaram e outros olhos que viram primeiro o fim do caminho onde ela iria acabar? Será que ela entende que talvez não faça ninguém feliz, quanto mais um monte de gente, e ainda assim mantém inabalável sua fragilmente linda suavidade? Ou estará ela fazendo o que você também faz quando ninguém te vê fazendo?
Talvez ela não saiba, nem sonhe, que se encaixa em algum também do mundo, tão cheia de sua graça que é. E quem sabe isso lhe tire o direito a todo o resto, a cuidar dela, a se cansar, de lerolero, ou de qualquer coisa, a embaralhar adverbios que amontoa tentando ligar as adversidades de suas ideias, sem o mínimo sucesso. É de dar pena toda essa graça.
Me conforta enfim voltar os pés aqui na madeira fria da madrugada de um dia de feira e saber que tudo isso não passou de fingimento. Que alívio saber que o círculo espera por ela não apenas para tangenciá-lo, mas para vesti-lo, sê-lo, para fazer dele o que quiser e precisar quando o quiser e precisar. Só espero que saiba, essa garota, que ele leva novamente ao ponto de partida, independentemente e por mais que tenha sua localidade sido transferida e o cenário por onde ela tateia no escuro a continuação da linda linha dentro da qual ela se sente no caminho certo.
Ainda bem que existe em algum calabouço dessa história toda um pouco muito de Carolina, e que sua intensidade rouba da parte Ana um pouco de toda a sua graça, caso esse já absolvido e condenado por vereditos muito diferentes, e que porém continua intrigante, essa espera pela revelação de toda Carolinadade que se guarda nesse corpo dividido. Viva a dualidade, tão diversa como mais não se poderia supor!

Polvo,o mar,o sol. Ainda quero os raios.

Quero ter(e isso significa dar, irradiar, ou o que seja. não, irradiar até que funciona muito bem pra essa intenção) eum amor que saia, que cresça e do centro vá a todas as outras partes, feixe de luz forte vivo e volátil, e rápido ou lento conforme as batidas dos corações que cruza pelo caminho inédito de ar que traça ao passar o quiserem e escolherem. Que seja azul, branco e luz, amarelo, laranja, rosa ou verde pra quem precisar, que saiba ser de todas as formas mas que fundamentalmente nunca se conforme com seu tamanho e queira sempre crescer e sair, me deixar porque não é e nunca foi meu, como um rio que não pertence a sua nascente mas tem seu destino já certo, sem o saber.
E não algum rabugento, cefalopódico tal qual as bengalas de um velho animal que exaurido pelas amarguras que acumula no saco de pedras que carrega, usa seus tentáculos para se prender a uma caverna, onde mora seguro e sugando das paredes de corais sua verdade. Não dá pra ser assim porque se fosse tudo isso que entra no polvo, que seria eu, iria inchá-lo mais do que sua cabeça pudesse suportar, e de nada adiantariam tantas pernas, que ele tem, que eu teria, se não fosse torná-las luz e torná-las públicas e de todos os seus vizinhos salgados; se fosse assim seria a cortina de fumaça lançada sobre os próprios olhos tão peculiares que perderiam aí, nesse exato momento, qualquer utilidade. Que o amor não esteja nunca preso à mim, que um corpo de polvo é muito pouco pro tamanho que ele quer e aspira a ter, que ele precisa ter, que ele possa viver grande e solto e em todas as direções. Que principalmente ele esteja nunca nunca nunca conectado à cabeça e sim que sirva de mestre e exemplo para que o resto de mim, acomodado na caverna, sinta enfim desejo genuíno de sair.

Porque se for pra ser assim parasitário e só meu, que não haja amor.
Que se seja então grão, ou vento, e levado pela rua, e observando. Pela rua que eu enxergo e penso que conheço e entendo, cujos limites habitam o mesmo plano da minha compreensão. Que esse se deixar conduzir sirva então de treino para o grande mar. O grande e Posseidoso, nos levando por onde quer, e que ainda que não exista amor nos espalha por praias e corpos e sóis que ninguém viu porque a cada dia amanhecem novos, outros, refeitos pela maravilha do horizonte que tão suavemente os acaricia sempre. Lá eu não sou nada e nem consigo pensar em tentar ser, lá não há aprendizado mas apenas permissão, permissão para ser tomado e descobrir aonde a vontade de qualquer tormenta bem entender que quer nos levar. Lá não se vê fim, não se tem fim, mas apenas outras praias, desconhecidas e sempre povoada; se não por quem nos possa fazer sentir e ser polvo ou tronco de luz ou qualquer coisa que exista realmente e que alcance algo, pelo menos eu sei que lá existem grãos. Tão pequenos e frágeis e curiosamente com vontade de viver e de se tornarem o que talvez já sejam em algum lugar de sua miudeza quanto nós.
E prefiro uma onda que me leve com ou para quaisquer grãos do que a parasitariedade da caverna escura , me sugando, me sugando e acabando comigo, porque os raios querem sair e chegar, querem pelo menos receber luz, preferem ser lagarto estirado ao sol. Que haja por favor algum Sol.
E assim nos deixamos ir e levar,

outra oração?12.6

Mas que belo dia pra escolher se desesconder mais uma vez,hein.
Agora não mais, mas sim, 12 de junho, mais um desses dias que tão felizes nas memórias de quem os tem repletos justamente porque os viveu dividindo-os. Porque esse dia só se faz um inteiro se houver dois, mas será mesmo?

Tenho a dizer com sufocante honestidade que ainda não sei.
Vejamos por exemplo, tive um dia clássico. talvez até mais clássico do que o esperado. Não regado a lágrimas como tradicionalmente se poderia esperar, porque também me dói e me consome o não ter por quem chorar essas lágrimas que não guardo, que não moram no meu peito como tão heroicamente no das mocinhas cujos sonhos sempre dão o mesmo certo antes de os créditos rolarem pela tela. Foi sim e como foi regado a muito molho vermelho, de macarrão, e também o nosso fiel chocolate. Não tão voluntariamente como se pode supor, mas insistirei aqui em novamente culpar os reflexos.. Uma tal vacina do porco me trouxe uma linda batalha, travada de modo que respirar fica dificil, os rolos de papel vão se acabando e falar é uma tarefa hercúlea. Ok Ok exagero nesse dia, porque o dia não muda enquanto eu não durmo, pode.
Pra mim pode.
Pra quem faz parte da data por estar vivo mas não tem a data fazendo parte da sua vida (jájá eu descubro se eu acho que não tem mesmo ou sim), declaro para o alívio deste todo, que pode.
Sem culpa e talvez ajude um controle procurando um filminho que não aconteceu na sua vida ainda, ou pelo menos não agora. E nem presenciar o amor alheio me fez sentir o tapa da solidão. Senti seu abraço. Seu olhar esperançoso de alguém que gosta mas sabe que sua partida fará o outro melhor, ou pelo menos que é isso que quem se gosta pensa. E assim ela o fará, algum dia.
Só não sei, e nem quero tanto saber agora mesmo, se as saudades da solidão não seriam piores do que a ambição por algo de que ainda não se sabe o gosto.
Será que todos nasceram pra fazer gol e se esconder e correr por aí? Quem vai ser o goleiro, quem fica de pegador no começo da brincadeira? Quem abre a mão que não vai caber nas outras da roda, cerradas entre si, prontas e sem você? Talvez eu.
Num desses achados que só poderia rimar com Dia dos Namorados eu vi há pouco uma portuguesa(sim,num filme em inglês), que empregada e charmosa, não bela mas ainda assim interessante, cheia de gestos, cheia de desconhecimento do mundo dos outros e contudo tão cheia de paz e serena, dizer entre o maremoto de seus olhos abertos, revelando o coração turbulento: "Vou sntirr saudadsh suash"; ela o beijou e saiu. E eu desliguei.

Não foi impossível e nem me perturba agora (pelo menos agora, que eu ainda não deitei para deixar o silencio derramar sobre meu desejo de sono suas perguntas gritadas, suculentas, imoralmente irresistiveis) não saber se aquele caminhar rumo ao horizonte foi o ultimo. Se aquele turbilhão de sentimentos querendo se soltar da caixa, querendo romper as correntes, vai deixar ou não, algum dia, de ser somente uma ideia. Mas eu gosto de saber que ele existe.
Como um boneco de colecionador, na caixa. Fechado, amado, amante, curioso, desejoso, repleto até a última gota de vida pra viver, de amor pra gastar e distribuir, com um arsenal de lagrimas para despejar e furia pra atirar e tudo aquilo que nada aquém da sua liberdade pode lhe dar.
E ele espera. E respira sozinho o seu proprio ar. Sempre morno e sempre seu.
Poderá seu aroma algum dia morar em outros pulmões? Quisera ele.
Mas lá ele está, alto e lindo em seu pedestal, e quem o passa o admira, e talvez alguém o compre por muito mais do que apenas sua fabricação valeria. O que lhe confere valor até mesmo inestimável, de quando em vez, é justamente sua espera, resignação silenciosa que deu ao resto do mundo muito trabalho, pra manter o embrulho lacrado.
Quantos olhos que o miraram já não desejaram ter dilacerado com as mãos atrozes a santidade da embalagem fechada? E soltar o boneco, e lançá-lo, e sê-lo, e depois de tê-lo bem mas bem vivido quebrá-lo, e sofrer com isso, e fazê-lo triste por ser inútil até que ele pare em uma outra caixa, grande, vazia, e coletiva. A lata cinza, o lixo.
O boneco teme esse seu destino fatal, que do alto da prateleira viu acontecer tantas e tantas outras vezes com todos que cairam na tentação de deixarem-se soltar. Ele tentara, em vão, convencê-los a ficar. Tentara lhes vender a promessa fácil de vida eterna, sobre o mundo e longe dele, o véu que não deixa ser vista a princesa mas que lhe dá perfeita capacidade de ver tudo. Mas até onde ele enxergou?

E foi num dia como todos os outros (sim,já sabemos que algo mágico está por vir), que ele falou com ele, um de seus antigos amigos de pedestal, que ele vislumbrou de longe, lá embaixo, brilhando na lata reluzente. Esse, surpreendentemente, tinha o rosto intacto e não perdera outra coisa senão as asas. Bastou isso para lhe conferir a inutilidade perpétua. Ninguém sequer chorara por aquele brinquedo, não foi uma criança triste que lhe deu o ultimo adeus, desejando, tão inutilmente quanto, que nada de errado tivesse acontecido. Lá ele fora depositado pelas mãos frias do adulto que o encontrara na poeira detrás da cama. E olhando para ele, o alto solitário lhe perguntou, se ele se conformara com aquele fim e mais precisamente, o que realmente o perturbava naquele momento. Porque sorria?!
E assim como a mulher que na iminência do próximo tchau ser um ultimo adeus, não deixou entrar em sua casa palpitante o temível e horroroso filhote de "e se.." e beijou com a alma, ainda que muito rapidamente, esse ex-voador lhe disse, que o preço do pedestal era alto, tão alto quando a vastidão com que sentira suas asas tomando o mundo quando viveu do outro lado, do lado dos outros, que só por isso poderia também ter sido chamado de seu. E o encaixotado ouviu cada fonema e mastigou aquela vida alheia, que desejava, que temia, que finalmente queria mais do que a glória, mais do que os instantâneos olhares de admiração que inspirava, e com os quais se contagiava e sentia-se amado, mas que logo o deixavam porque era inalcançável.
E ele quis estar no nível dos olhos dos outros. Quis ser visto de perto e sentido como sabia que devia ser, como sabia que a vida dentro daquela caixa poderia o tornar. Quis pular, porque agora não temia tanto a queda como ansiava pelo frio na barriga, pelo sorriso de surpresa de algo novo e alimentante em sua alma nova.

Só, que com o derradeiro suspiro de seu amigo sem asas, que transformara em umas poucas palavras sua piedade em inveja de vontade de ser que nem, ele realizou que não sabia mais quanto tempo duraria para que novos olhos quisessem captar nele a vontade de finalmente se soltar, e desejou esses olhos mais que tudo, mais que nunca, tentando manter acesa em si mesmo a chama de vida que finalmente uma faísca de pouca credibilidade como qualquer antecessora conseguira, Graças à Deus, suscitar.

sábado, junho 12

ALTO LÁ! uma oração

vou fingir que não é minha culpa o sumiço das coisas que estão saindo daqui agora.

não, não vou não.



Sim, já faz tempo. mas quanto tempo pode ser considerado um bom tempo pra nos fazer enferrujar e ter que se esforçar um pouco mais pra sair do lugar do que da primeira vez?

Talvez não seja nem pelo muito tempo que se passou, que pra mim, ou melhor, pra voces pedaços, acho que foi muito tempo sim, mas por causa da decisão (consciente?quem sabe) de guardar pra mim, de escrever num livro que se fecha e esconde ao invés de pintar em letras garrafais, coloridas e suas o mural do mundo e da vida de qualquer transeunte.

Provavelmente foi o tentar tornar minha uma coisa que não é, a falta de lembrar das palavras de gentileza exposta nas ruas da cidade por que passamos, todos nós e eles também, tão apressados, sem nos dar conta de que merecemos aquelas palavras. Pior do que duvidar de que somos o destinatário das mensagens de amor da vida, é não enviá-las quando é você o encarregado de escrevê-las ou dizê-las, a quem bem se sabe que merece. Todos. Tudo.

Não é a única nem a mais eficiente eu imagino, mas essa é a minha mais importante maneira de tentar esse tudo que tanto se quer alcançar e eu a deixei,

pela falta de tempo.



Mentira mais cheia de espinhos não poderia existir.



Como pode-se ter algum dia acusado o tempo de faltar se é ele, e somente ele, justamente a coisa que mais existe e que nunca para de se renovar, de se reinventar, de existir mais uma vez no mundo? Não nos falta tempo, nos falta coragem e disposição.

Não é a coisa mais simples e livre de impactos pessoais que existe, se abrir e se atirar ao mundo, se deixar transmitir por aí, se espalhar nos canteiros da vida por onde passamos e onde faltam as flores que procuramos sem entender que talvez sejam nós mesmos. A nossa ausência não apenas tira a cor dos jardins por aí, mas também nos impede de crescer com o estímulo de toda a natureza ao nosso redor.

É muito mais maravilhoso do que angustiante, esse negócio de ser dar ao mundo. E ainda assim tantas chances são perdidas por aí...
Espero apenas e ainda que possamos encontra-las, e fazê-las nascer dentro de nós. Amém.

quinta-feira, junho 3

e de repente, ainda assim tão logo, percebeu-se que não era ele.
Vi que o amor vinha de mim mesma, irradiando-se em todas as direções, forte lindo e novo a cada respiração ofegante que resulta de seu contato direto com algum corpo ou energia que o faça esquentar.
E num instante apaga-se a velha ideia, compreende-se e assim mata-se a velha crença. A de que era dele que, como de um ser naturalmente de existência excepcional, fluia naturalmente algo que eu como um transformador recebia e o que era a única matéria-prima possível do único produto relevante que meu tambor peitoral aprendeu a produzir, o amor.
Ele simplesmente precisaria existir, e de lá eu sugaria mesmo à distância o néctar da mais fina flor, improvável e impossível e ainda assim mais presente do que qualquer outra substância na lista dos ingredientes que a receita da felicidade exige que sejam comprados, ou melhor, conquistados.
E ele existia independentemente dessa receita, ele provavelmente, ele quase que certamente nem duvidava da existência da receita, e apenas desfilava sua magnificência por aí, espalhando a matéria-´rima gratuita pra qualquer candidata ao vício do amor que ele causava. Será mesmo?
Será que não era ele, esse sim, o grande alvo? que sendo carregado pelo vento de abelha em abelha, de solo em solo, produzindo depois de árduos dia de sol que queima como o arrepio e de chuva, e de chuva, salgadas lágrimas que deixou escorrer por suas flores, descuidado desculpando-se com a intenção de que se fortalecesse; as mais belas componentes de um jardim maravilhoso de mulheres novas e vivas, que seguiram seus rumos, que trilharam seus caminhos, que desfincaram as raízes de sua terra e buscaram por si próprias solos mais férteis onde pudessem ser singulares, especiais, interessantes? E onde fica essa velha semente, já tão gasta pela mania de ser pólen e se deixar carregar? Onde se esconde sua magnificência agora que já nenhum girassol o persegue?

Não existe.
Nunca existiu.
E hoje a rosa, grande e bela como ele a fez, como ele não a quis para si, mas causou que se tornasse para o mundo, o vê pequeno.
Vê a semente não como o motivo de sua existência, mas como o seu passado, ressequida, morta, desvirtuada depois de dar flores e flores cujo nome nem mesmo se recorda.
Ela, a rosa, se lembra de quantos de seus espinhos arrancou, de como se poliu para não ferir o magnífico e grandioso pólen que tanto venerava, e como agora daria tudo para ter de volta sua selvageria. Mas ela também já não é mais o mesmo botão que antes não sabia o que querer.

Se a rosa foi então capaz de enxergar de onde não vinha tudo aquilo de físico e imaterial que exalava, certamente ele se dava dicas inconscientes de de onde tudo VINHA;
e era dela.
era dos vasos de seiva que as lágrimas de orvalho molharam, encheram, fizeram secar, e dos lugares onde a ameaça de ser cortada e morte tornou seus amortalhados nervos praticamente humanos, que se expandia tudo aquilo que num poema qualquer decidira-se chamar amor.
O amor era dela, e no entanto só poderia existir e ser computado e materializado uma vez que não mais a pertencesse e ela o tivesse entregue a outrém, que por sua vez o receberia em tantas formas e tamanhos quanto lhe fosse possível compreender.
Porque o seu duro despontar fez da rosa flor mais forte do que se supõe,
e se ela for capaz de garantir a si mesma,então o amor que ELA tem para o mundo e também para o pólen, por mais que agora de uma outra dimensão e momento, não mais deslumbravél, mas aceitável, se espalhe por aí, e caia sobre nós

"Derrame o dom sobre nós
abençoe a nossa voz;
céu mudou, tá chovendo amor
Gotas de amor.
Deixa que o amor caia sobre nós
Deixa que o amor caia sobre nós !"


quarta-feira, fevereiro 17

começando tudo de novo,
pra ser 10, pra ser um grande legal.
mas quem é que escolhe o que a gente leva e deixa pra trás?
nessa bagagem louca onde coisas que a gente pensa ter perdido há muito tempo aparecem nos bolsos secretos dentro da mala; despertando um sorriso. e depois um calafrio. E depois apertando o play de várias ceninhas de um filme amador que correm em câmera lenta, aquelas das quais você é o telespectador mais fiel e fanático. enquanto isso seu corpo tenta acordar alguma parte do seu cérebro que eventualmente ainda esteja acordada, pra perguntar o que fazer com aquelas peças de roupa..
Por enquanto você as abraça apertado, isso te faz sorrir, e você lembra.. e pensar vai ficando pra depois

Albert Einstein

Viver é como andar de bicicleta.
É preciso estar em constante movimento para manter o equilíbrio.

LIVE HIGH ! (Jason Mraz)

I try to picture a girl through a looking glass. See her as a carbon atom, ee her eyes and stare back at them. See that girl.. As her own new world. Though a home is on the surface, she is still a universe

Glory God, oh God is peeking through the blinds! Are we all here standing naked taking guesses at the actual date and time? Oh my, justifying reasons why is an absolutely insane resolution to live by...


Live high, Live mighty, Live righteously... Takin it easy.

Live high, live mighty, Live righteously.


Try to picture the man to always have an open hand. See him as a giving tree, see him as matter. Matter fact he's not a beast. No not the devil either, always a good deed doer.

And it's laughter that we're makin after all

The call of the wild is still an ordination why. And the order of the primates, all our politics are too late. Oh my, the congregation in my mind is this assembly singing gratitude, practicing their lovin' for you.

Just take it easy and celebrate the malleable reality. Because nothing is ever as it seems, this life is but a dream