sexta-feira, maio 1

Joseph Conrad (1857-1924)

Only in men's imagination does every truth find an effective and undeniable existence. Imagination, not invention, is the supreme master of art as of life.

"Apenas na imaginação humana toda verdade encontra uma efetiva e inegável existência. Imaginação, não invenção, é o mestre supremo tanto da arte quanto da vida."


Suína

1º: Confissão suína.
Sexta feira, 24 de abril, 2009. Por volta das 22h30min;
eu, solitária, entre a família, observando com três graus de miopia - ou seja, sem enxergar nada a felicidade das crianças correndo, que eu tanto desejo pra mim de volta, na festa de aniversário de quinze anos da senhorita Giovanna Santucci (que por acaso foi deslumbrante). 
Passa uma moça. Salgados na mão. "Pastel, aceita?". Indecisão. "As meninas não chegam, eu to com fome, depois vou dançar.. 'É de que?'". "Pizza". (pergunta se tem presunto, pergunta se tem presunto, pergunta se tem presunto). Não perguntei. "Por favor, Obrigada." Mordidinha. A casquinha é boa. Mordidinha. Vejo algo, parece queijo com tomate. Criativo. Mordidinha.
Era presunto.
Sim. Era presunto.
(cuspo ou engulo cuspo ou engulo?????????) Já era.
E foi assim que um pequeno pedaço do que eu deixei pra trás me perseguiu e me encontrou na noite de sexta-feira passada. Mas como foi por acaso, não dá pra não rir, então eu ri, da trouxinha de papel com meio pastel dentro que eu deixei no banquinho de presente pro vento.
E também ri quando me falaram que era macumba de um amigo apaixonado por maminha, que organiza a macumba da Ana Mazzotini pra me atrair de volta aos prazeres da carne. Pena que pra mim não são mais prazeres, acho que são, no máximo, anedotas.

2º Memória suína.
Eu tenho uma tia. Ou melhor, da mãe da minha mãe também nasceu por último no mês de fevereiro perto do meu (sim, piscianos/as se atraem), uma certa centelha. Uma certíssima centelha. Uma certeira centelha. Daquelas que a energia não se exauri nem depois do trubilhão de risadas que te deixa completamente sem fôlego e sem sentido nenhum nas palavras que tenta articular, numa luz sem limites que transcende o seu corpinho tchuco e fica nos lugares por onde ela passa. Numa vida que pulsa nas brincadeiras, nas coragens e nas aventuras de uma vida tão bem vivida que me daria inveja se não me desse tanto gosto e orgulho de tê-la conhecido. A suína, pra quem eu sou a bovina.
Mas suas aventuras, sua vida cigana nos afastou e provavelmente a minha ainda nos unirá, mas por enquanto tenho que viver por aqui, e as vezes me recordo de um dos temas que ela abordava com mais perícia durante as indescritivelmente deliciosas "reuniões familiares" que mais pareciam stand-up comedy shows, com ela sempre no comando. Suína e as coelhas que dançavam tango. Suína e os caranguejos caipiras no saco do banco da frente, sentenciados à morte em ebulição - ela dublava as falas dos mesmos, enquanto caminhavam para a morte, escura e desconhecida, com a doce ilusão de que iriam conhecer a capital. Pobres caranguejos, eu nunca os comi. Me orgulho disso.
O assunto que me importa mais agora é que eu sempre tive esse estranho hábio de querer conhecer os banheiros dos lugares onde eu vou, principalmente de restaurantes. E quando eu era pequena (só pra não ficar constrangedor) eu também lavava as pias desses lugares. E ela entrava no banheiro, me surpreendia e depois falava pra todo mundo de volta à mesa que quando eu crescesse, definitivamente seria uma lavadora de pias. Nem preicso mencionar o tamanho do meu bico né? Mas agora eu acordei pra como eu acho legal julgar os lugares pelos banheiros. Ainda que não seja um julgamento propriamente dito, uma lembrança forte. Talvez eu não lembre do lugar, mas os banheiros me ficam. Me prendem. 
Não me é diferente com as mãos, na hora de conhecer ou lembrar de alguém. Com certeza alguém cujas mãos eu ainda não toquei ou não vi com atenção, é alguém que eu corro o risco de perder nos labirintos do meu jardim da memória. É porque ele é completamente suspenso, e é inevitável escravizar algumas memórias, como pessoas e restaurantes, a mando de outras, como mãos e pias/banheiros. Entretanto algumas mãos sempre voltam, agumas pias sempre voltam, e ficam lá, borboleteando pelo jardim e as vezes fazem a maior confusão.
Mas talvez seja recomendável cultivar e exercitar um pouquinho de loucura e desrespeitar alguns limites temporais, como já me 'dizia'(mostrava) uma certa suína..